Contextualização

Compreendendo os perímetros irrigados enquanto geometria e geopolítica de redesenho do semiárido nordestino

Pensar o Nordeste envolve, antes de tudo, uma experiência de paisagem, em que o aprendizado de ver requer constantemente o desafio de enxergar o secreto e duvidar das aparências do visível. Ver o sertão, a bem da verdade, é se incomodar com quem lhe retrata como natureza morta. É, por sua vez, colorir os tons de aridez que lhe cabem, sem esquecer as tintas do verde infinito do juazeiro e sem desprezar a vida que se guarda na caatinga, a poesia do xique-xique e do caroá, a versatilidade dos carnaubais e o milagre da multiplicação das manivas. A depender do tempo em que se faz a travessia no sertão, é ver que a água ora é o estremeço do trovão quando se ameaça tempestade e ora é o desolado atravessar por rios que só existem no batismo de serem rios e na esperança de voltarem a ser preenchidos pela próxima invernada.

Apesar de que haja muitas verdades no dizer de Guimarães Rosa, para quem “o sertão é uma espera enorme”, precisaremos atestar que o sertão também existe em puro movimento de transformação dessas paisagens e visões. Pois ver o sertão é também reparar no que dele é feito pelas gentes, na medida em que novas aparições vão se impondo ao olhar, frutos das diversas arenas em que se travam as disputas sobre a natureza do semiárido e suas significações socioculturais, onde as razões e estratégias próprias a cada grupo entram em conflito na medida em que se reivindicam apropriações diferenciadas com relação ao uso dos territórios.

Essas novas aparições simbolizam as linhas de força que estão a manejar os traçados para o redesenho do semiárido nordestino. Por um lado, a visão não pode deixar de incorporar as cisternas de placa que se multiplicam na beira das casas, em seu branco impassível, a repactuar o paradigma da convivência com o semiárido. Por outro lado, ou, às vezes, no mesmo lado, e até mesmo por cima das cisternas[1], despontam extensos canais construídos de cimento e concreto, a acompanhar ou cortar as estradas, conduzindo a água, armazenada e bombeada desde as piscinas, açudes e barragens, aos lotes de terra circunscritos que sejam destinados a serem por ela irrigados.

A geometria traçada pelos canais não delimita apenas as fronteiras dentro das quais opera o aparato técnico e institucional dos perímetros irrigados, mas orientam também profundas redefinições sobre o modelo de desenvolvimento planejado para a região, demandando uma análise que os situem enquanto estratégia geopolítica de expansão seletiva da fronteira agrícola no semiárido nordestino. Pois, como trataremos mais adiante, os perímetros irrigados têm atuado como verdadeiros vetores de indução do processo de modernização agrícola na região.

A partir deles, novas representações vão sendo criadas no horizonte de um Nordeste rentável, onde a preconizada idéia de atraso e isolamento do sertão vai cedendo lugar à noção de um semiárido promissor, numa reformulação discursiva que pretende se adequar às novas demandas de inserção do capital na região, para o qual já não interessa mais uma imagem homogeneizada em torno da pobreza e miséria. Antes, pelo contrário, é preciso anunciar as vantagens comparativas, enfatizando a idéia da viabilidade econômica da região.

Ao capital interessa essa reinvenção específica do Nordeste, em que caibam “novos dizeres, representações mais plurais e manejáveis, que se afinem com as diferentes possibilidades de exploração econômica da natureza, desde a indústria extrativa da mineração ao plantio de cana, fruticultura irrigada, turismo, carcinicultura, dentre outros” (CASTRO, 2000 apud BARROS, 2013, p. 34).

Nesse sentido, os perímetros irrigados são definidos no bojo das estratégias de atração e fortalecimento das empresas do agronegócio, incentivadas a usufruir das vantagens naturais, a exemplo da insolação contínua e solos férteis, das vantagens construídas, como a oferta da água em abundância possibilitada pelos perímetros, além das outras vantagens que surgem como efeito da chantagem locacional, como disponibilidade de força de trabalho a baixos custos, isenções fiscais, flexibilização de legislações ambientais, trabalhistas etc.

Assim é que, para acompanhar as transformações da paisagem relacionadas aos perímetros, precisamos estar atentos ao que eles significam em termos da reconfiguração do espaço, que se dá, inicialmente, pela construção de novos fixos, na medida em que a implantação dos perímetros se faz acompanhada de várias outras infra-estruturas que vão sendo instaladas na região, necessárias à realização das obras, sua manutenção ou circulação da produção, entre as quais poderíamos citar o exemplo da construção de pequenas e grandes barragens, a transposição do rio São Francisco, canais e piscinas de escoamento da água, modernização e ampliação dos portos e aeroportos, bem como a melhoria e abertura de novas estradas.

Mas, indissociada aos fixos, essa reconfiguração espacial se dá também pelo estabelecimento de novos fluxos (SANTOS, 1988) sociais, econômicos e culturais, anunciados, durante a travessia, pelas plantações que margeiam os canais de irrigação, através da visagem da monotonia sem-fim de monocultivos cuja produção é voltada basicamente para produção de frutas in natura,destinada a abastecer os mercados externos, especialmente de melão, banana, abacaxi ou mamão (ELIAS et al, 2007).

Entre os anos de 1968 a 1992, foram construídos pelo Governo Federal, sob gestão do DNOCS, 38 perímetros públicos irrigados no Nordeste, mais especificamente na região conhecida como “polígono das secas”, conforme indicado no mapa e na tabela abaixo, que os detalham por período de construção e estados receptores. Nesse período, a prioridade de verbas se destinou aos projetos hídricos que se localizavam nos vales úmidos, como Gurgueia e Parnaíba (PI), Acaraú e Jaguaribe (CE), Itapicuru e Rio das Contas (BA) e Açu e Apodi (RN).

Conforme Bursztyn (1995) e Diniz (1997), a irrigação pública implantada pelo Governo Federal no Nordeste tinha, principalmente, os seguintes objetivos[1]: introduzir um novo modelo de produção agrícola nessa região, via modernização da agricultura e incentivo a culturas agrícolas de maior rentabilidade, com destaque para a fruticultura irrigada, e minimizar os conflitos fundiários, desviando o debate da reforma agrária para a proposta de colonização que se desenvolveria por meio da seleção de irrigantes para ocupar os lotes dos perímetros públicos.

A partir de 2011, no contexto da segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC2), com mais recursos e mais parceria com estados e municípios, percebe-se, no que diz respeito aos planos do governo federal, que estamos diante de uma “nova política nacional de irrigação”, conforme anunciado pelo Ministro da Integração em exercício à época[2].

Além de prioridade orçamentária, essa “nova política de irrigação” tem sido ancorada pela reformulação de seu arcabouço institucional, legal e regulatório, bem como do seu sistema de gestão, créditos e subsídios. Destacamos a Lei nº 12.787, promulgada em janeiro de 2013, que institui a Política Nacional de Irrigação e elenca seus objetivos:

I – incentivar a ampliação da área irrigada e o aumento da produtividade em bases ambientalmente sustentáveis;

II – reduzir os riscos climáticos inerentes à atividade agropecuária, principalmente nas regiões sujeitas a baixa ou irregular distribuição de chuvas;

III – promover o desenvolvimento local e regional, com prioridade para as regiões com baixos indicadores sociais e econômicos;

IV – concorrer para o aumento da competitividade do agronegócio brasileiro e para a geração de emprego e renda;

V – contribuir para o abastecimento do mercado interno de alimentos, de fibras e de energia renovável, bem como para a geração de excedentes agrícolas para exportação;

VI – capacitar recursos humanos e fomentar a geração e transferência de tecnologias relacionadas a irrigação;

VII – incentivar projetos privados de irrigação, conforme definição em regulamento. (grifos nossos)

 

Cria-se, ainda, a Secretaria Nacional de Irrigação (SENIR), que tem, entre suas competências estabelecidas no art. 19º do decreto nº 8.161/2013, “promover os negócios da agricultura irrigada” e “promover a implementação de projetos de irrigação e drenagem agrícola”.

A meta estabelecida é a de que, até 2015, tenham sido investidos recursos públicos da ordem de 6,9 bilhões de reais para a expansão dos perímetros irrigados, visando a ampliação da área abrangida pelos perímetros já existentes em 193.137 ha e a instalação de novos perímetros em 200.000 ha, com ênfase na perspectiva de aumentar em 100% a gestão privada das áreas irrigadas, substituindo a gerência estatal (PONTES et al, 2012).

Em mapa apresentado no relatório das obras referentes à irrigação, elaborado por ocasião do 7º balanço do PAC2[3], podemos visualizar a amplitude do que tem significado essa proposta de expansão.

Apesar de que, durante os 40 anos de experimentações dos perímetros irrigados no Nordeste, ainda não tenha sido construído nenhum espaço público de discussão sobre as transformações percebidas na região que reorientassem uma decisão democrática sobre quais perspectivas de futuro e estratégias devessem ser acionadas, as informações acima apresentadas sobre a expansão dessa política indicam a presença de uma avaliação positiva, por parte do governo federal, da agricultura irrigada enquanto eixo prioritário de indução do desenvolvimento da região, anunciada por ocasião de um dos discursos proferidos pelo Ministro da Integração, segundo o qual “a agricultura irrigada é a atividade econômica que trouxe os melhores resultados para o país, superando setores como a indústria automotiva e a naval (…) emprega 550 mil trabalhadores e gera R$ 500 milhões em impostos por ano”[1].

Essa avaliação, entretanto, não leva em conta uma teia complexa de impactos desdobrados nos territórios com a implantação dos perímetros e das atividades econômicas que a eles têm se associado, especialmente no que diz respeito ao avanço do agronegócio da fruticultura irrigada e as transformações sobre a saúde, o ambiente e o trabalho da população rural.

Mantém-se impassível mesmo diante do imenso arsenal de denúncias sobre violações de direitos atribuídas a essa política, formuladas tanto pelos sujeitos em seus territórios, quanto pelos movimentos sociais do campo, redes de advocacia popular e organizações civis de promoção dos direitos humanos. Nem mesmo o peso das evidências científicas acerca dos impactos ambientais, das reconfigurações fundiárias e trabalhistas, frutos de diversas pesquisas acadêmicas realizadas em regiões onde se instalaram os perímetros irrigados e o agronegócio da fruticultura irrigada, ou a repercussão midiática, em âmbito local, nacional e internacional, dada a essas questões problemáticas têm sido levados em conta nessa avaliação.

A expansão dessa política se dá, portanto, em pleno desperdício da experiência social (SANTOS, 2000), e tampouco explicita reconfigurações importantes pelas quais têm passado a gestão dos perímetros públicos irrigados no decorrer dos anos, a exemplo do emblemático processo de privatização das políticas públicas de irrigação, a ser abordado nos tópicos que seguem.

Tal avaliação peca, por fim, ao pretender descontextualizar a proposta por ela implicada de redesenho do semiárido das diretrizes macroeconômicas de integração regional à dinâmica capitalista global, naturalizando as decisões políticas e econômicas assumidas, como se estas fossem destituídas de uma construção histórica que, por sua vez, tem sido perpassada por interesses os mais variados.

Protegida sob o velho manto legitimador das políticas de “combate à seca”, a expansão dos perímetros irrigados do Nordeste segue sem que esteja devidamente verificada a eficiência dessa “nova política de irrigação” em servir à superação das reais estruturas pilares promotoras das desigualdades sofridas pela população nordestina. Ou se, a exemplo das premissas sobre as quais se fundamentaram a denúncia da indústria da seca de que se beneficiavam os velhos coronéis, constituem-se os perímetros irrigados numa atualização daquela, enquanto espécimes de continuidade de políticas que, por não enfrentarem as condições estruturais de produção das desigualdades sociais na região, são fadadas a não resolverem os reais problemas elencados desde a perspectiva dos sertanejos e a serem aproveitadas pelas elites agrárias como objetos de circulação de capital e de insumo ao fluxo de apropriação capitalista dos territórios (BARROS, 2013).

Cientes da heterogeneidade no desenvolvimento temporal dessa política, que configurou particularidades a cada perímetro irrigado, buscaremos analisar o direcionamento apontado pelo atual processo de expansão, compreendendo que há uma convergência nessa proposta seletiva de ampliação e multiplicação de perímetros específicos cujo dinamismo econômico se articula à expansão do agronegócio na região.

Adiante, e durante os capítulos seguintes desse extenso dossiê, tentaremos direcionar um feixe de luz para os bastidores dessa política, assumindo o desafio de trazer à tona informações e análises que ajudem a desvelar alguns dos elementos omitidos. Organizados sob uma perspectiva pragmática que busque entrelaçar tais elementos à produção dos respectivos efeitos decorrentes, especialmente no que diz respeito ao marco da violação de direitos, esperamos que seja uma contribuição ao amadurecimento dos questionamentos que devem ser direcionados a essa política pública.

 

1. O Nordeste das secas e da expropriação sucessiva: a construção de uma “região problema” e das histórias dos interesses que permeiam as políticas de “combate às secas”

 

Sobre o Nordeste desdobraram-se várias intervenções diferenciadas no curso histórico do desenvolvimento do país. No bojo da diversidade de interesses que orientaram o desdobrar dessas intervenções, consolidou-se um amplo consenso a respeito da centralidade devida às irregularidades pluviométricas da região, colaborando para alçar a seca ao status de elemento-chave para justificar e legitimar tais políticas, conforme nos mostram os estudos de inúmeros autores, entre os quais Oliveira (1981), Maranhão (1984), Bursztyn (1985), Carvalho (1987), Andrade (1986) e Paulino (1992). Tratada basicamente como calamidade, e não como um período mais prolongado das estiagens características do clima tropical semiárido, a seca tem sido reforçada no campo discursivo como ponto forte para sustentação do discurso que assegura a intervenção sempre presente do Estado.

Se, à primeira vista, nos parece óbvio que a seca é a base do discurso do planejamento regional nordestino, ensejadora de todas as políticas de irrigação que se sucederam na região, um olhar mais atento indica, entretanto, a necessidade de destrinchar o processo social através do qual esse problema, aparentemente de fundo natural, foi construído e como ele tem sido acionado de diferentes formas, conforme os ciclos econômicos da região e a necessidade de reprodução do capital.

A invisibilização dos interesses e discursos que são construídos sobre o Nordeste, aos quais se subordinam as políticas de desenvolvimento e de irrigação historicamente realizadas na região tem servido a dois efeitos complementares. O primeiro, de fazer da seca o elemento catalisador por excelência das propostas de intervenção na região, quase inquestionável, reelaborado ao longo da história, cumprindo sempre o papel estratégico de explicar o real, criando-o e servindo de “acelerador histórico da expropriação sucessiva” (ALBUQUERQUE JÚNIOR apud BARROS, 2013). O segundo, de enevoar a fronteira entre o público e o privado, através da “subordinação dos interesses da região a interesses pessoais, enquanto um problema que se renova, junto com a transformação das velhas oligarquias em grupos de poder econômico e político que controlam as opções de aplicação de capital e o acesso ao crédito, do mesmo modo como controlaram o acesso à água desde o início do período colonial, mostrando uma notável interligação entre a formação de capital e a reprodução do poder político” (BARROS, 2013, p. 40).

O momento histórico que situa o surgimento da seca como marco emblemático definidor do Nordeste e legitimador das estratégias de canalização de recursos públicos para a região, pode ser demarcado em 1877, a partir da crise do complexo algodoeiro-pecuário que se desenvolvia no semiárido. A visibilidade construída em torno do “Nordeste das Secas” foi essencial para constituir a base ideológica a que se reduziu a representação do universo social da região como um todo. Tal ideologia teve o duplo efeito de servir “como elemento unificador de interesses, escamoteando conflitos intra-regionais de classe”, e de viabilizar “o surgimento da “questão nordestina” (OLIVEIRA, 1990), a questão regional por excelência” (BARROS, 2013, p. 18). A partir da seca, elevada ao debate nacional à categoria explicativa das desigualdades que se reconheciam entre as regiões ou entre o Nordeste e o poder central, fechava-se o campo de visão para os conflitos e desigualdades que operavam no interior da região.

Reforçando-se nos eventos de calamidades, a “seca” construía sobre o flagelo do sertanejo a riqueza das oligarquias que, em crise, “buscaram na canalização de recursos públicos para a região, sob o fundamento do combate à seca, uma forma de compensação pelas perdas econômicas sofridas e assim o faziam por meio da apropriação privada dos mesmos” (BARROS, 2013, p. 19).

Dessa forma, a atuação do Estado no Nordeste se efetivava com uma assistência emergencial aos flagelados, medidas implantadas após a estiagem, como resposta à constatação de uma nova manifestação do fenômeno, e com a criação de uma infraestrutura de armazenamento de água, a exemplo dos açudes, barragens e cacimbões, construídos no interior dos grandes latifúndios[2].

Enquanto os problemas sociais seguiam sendo obscurecidos pelo “problema maior” da seca, as populações do meio rural, praticantes da agricultura de sequeiro em suas pequenas produções familiares, viam sobre elas recair o efeito desigual da seca e o fardo da alternativa infernal de, não tendo condições para enfrentar sozinhos os imperativos climáticos do semiárido e as estruturas de poder historicamente construídas, ter suas terras griladas pelo latifundiário e migrar. Assim é que, das secas, ou melhor, das respostas oblíquas que o Estado a elas correspondeu, também resultou o agravamento da já elevada concentração das terras, pois, “pequenos proprietários inviabilizados vendem suas terras a baixos preços e os latifúndios crescem” (ANDRADE apud BACELAR, 2002).

Politicamente, era o tempo e o espaço “dos coronéis, da oligarquia latifundiária, das eleições fraudulentas e das violentas disputas pelo poder político” e “apesar de os desvios dos recursos destinados às obras contras as secas e a obtenção de favores políticos, via clientelismo, serem fatos conhecidos, não chegavam a afetar a imagem de sofrimento da região nem permitiam que ficassem claras as ligações entre a pobreza e as relações de produção” (BARROS, 2013, p. 22). Desse modo, no decorrer da história, os recursos oficiais direcionados ao semiárido foram aplicados de forma a manter inalterada a estrutura socioeconômica e política da região. De acordo com Oliveira (1981, p. 53), isso foi possível a partir da criação de um Estado oligárquico, no qual não havia a distinção entre o que era público e o que era privado: “O Estado foi capturado por esse – Nordeste algodoeiro-pecuário, e mais do que isso, num mecanismo de reforço, o Estado era esse – Nordeste algodoeiro-pecuário”.

Portanto, os modelos de política implantados no semiárido nordestino constituem um reflexo da força que as oligarquias dessa região exerceram historicamente sobre o Estado. De um lado, marginalizam as outras formas de apropriação e uso da terra, mascarando sua existência, de outro, produzem consequências negativas para as populações camponesas, excluindo-as dos benefícios do “desenvolvimento”. Assim, o Estado, capturado por tais elites, historicamente tem contribuído para o que alguns autores reconhecem como expressões atualizadas do “clientelismo de Estado” (BURSZTYN, 2010; FARIAS, 2000; BARROS, 2013), em que as políticas assistencialistas de distribuição de renda à população marginalizada se somam à continuidade da concessão de privilégios às elites, renovando-se mecanismos antigos de fidelização através dos quais direitos fundamentais são recebidos pelas populações como dádivas às quais devem gratidão, sendo os mesmos barganhados no bojo das obras de expansão dos perímetros e do agronegócio na região.

É somente a partir da década de 1950 que emerge uma crítica, por ocasião da seca de 1951, às barragens como uma “solução de caráter estreito, de pura engenharia, que deveria ser substituída por providencias de mais amplo planejamento econômico e social para o Polígono das Secas” (BARROS, 2013, p. 25). Tal formulação crítica à tradição da intervenção pública que operava na região, por sua vez, não se deu destituída de interesses próprios, significando, ao contrário, apenas uma reconfiguração dos objetivos do Estado com relação ao Nordeste. À época, o governo de Juscelino Kubitschek defendia para a região uma política de grandes obras, influenciada pela adoção cepalina de uma perspectiva da industrialização como caminho para o progresso.

Eram reformulados, então, os termos sobre os quais se propunha a solução para os problemas econômicos, sociais e políticos das regiões atrasadas. Esse contexto foi também caracterizado como um momento emblemático de lutas sociais no campo, tendo nas Ligas Camponesas seu exemplo de maior radicalidade. Ao passo em que crescia entre as elites o temor de um processo autônomo no campo popular que significasse uma profunda ameaça ao pacto político vigente, o governo precisou preparar uma resposta nova, que desse conta de amenizar os conflitos diante do novo “problema Nordeste”. Assim, é que, em 1959, Celso Furtado é nomeado por Juscelino Kubitschek para coordenar a “Operação Nordeste”, que mais tarde desembocaria na criação da SUDENE.

Segundo analisou Oliveira (1977, p. 77), sua função principal “era de evitar o choque frontal, ou seja, frear os movimentos populares e, ao mesmo tempo, integrar – de forma subordinada – a estrutura econômico-social do Nordeste à nova divisão do trabalho, comandada pela burguesia industrial nacionalmente instalada no Centro-Sul”. A criação da SUDENE, segundo Bursztyn (1985), se caracterizou como uma mudança de comportamento das instituições encarregadas da questão da seca, passando a ter como diretriz básica a transformação da economia agrícola no sentido da consolidação da modernização conservadora no campo. O Estado foi um dos principais condutores desse processo, através de uma série de políticas públicas[3] que procuraram adaptar a agropecuária às exigências do avanço do capitalismo.

Coube à SUDENE se responsabilizar pelo desenvolvimento e planejamento regional, tendo como objetivo primordial a reorganização do semiárido nordestino, com a abertura das frentes de colonização nos vales úmidos maranhenses, a promoção da irrigação no Polígono das Secas e a intensificação dos investimentos industriais. No contexto da iminência do golpe de 1964, o temor de que situações revolucionárias de maiores dimensões se tornassem inevitáveis no campo provocaram uma forte adesão das elites nordestinas à ditadura militar. Assim, a ditadura, que duraria até 1985, se voltou para sua base de apoio no Nordeste na forma de grandiosas promessas de desenvolvimento, de um “novo Nordeste” (BERNARDES apud BARROS, 2013).

Foi o período de surgimento dos grandes projetos de irrigação, que passaram a comandar a redefinição dos espaços, introduzindo-se neles como verdadeiros enclaves, em que assume destaque o papel da política de irrigação, impulsionada no final da década de 1960, como vetor de reestruturação do espaço agrário nordestino, por intermédio da implantação dos perímetros públicos de irrigação, utilizando-se do aporte hídrico armazenado durante a fase hidráulica.

A partir da década de 1960, a irrigação ganha o status de política pública, à época inserida no projeto desenvolvimentista “Brasil, Grande Potência”, contando com investimentos públicos e empréstimos do Banco Mundial para sua implementação. Passou a ser ressignificada para atender ao intuito de modernização da agricultura, através do estímulo ao uso de técnicas modernas e de investimentos de capitais públicos, organizando um espaço para a atividade capitalista no campo.

A política de irrigação passou a ser um intermédio através do qual se promovia a transformação do processo produtivo e das relações de trabalho – mudanças essas que não alteraram a estrutura fundiária baseada no latifúndio e tampouco significaram melhoria das condições de vida no campo, conforme bem expressa a adjetivação que alguns autores lhe atribuíram de modernização “conservadora” (GUIMARÃES, 1977), “excludente” (ELIAS, 2002) e “dolorosa” (SILVA, 1982).

 

2. Perímetros irrigados e a marcha da contra reforma agrária

 

Originada numa conjuntura política em que o Estado deixou de ser “autoritário por omissão” para tornar-se “autoritário ativo”, como acentuou Marcel Bursztyn (1985), a política de irrigação significou um instrumento de controle social e, consequentemente, um meio para difusão dos valores autoritários e repressivos da ditadura militar, fragilizando as relações comunitárias de produção e proporcionando a expansão do capitalismo e das relações baseadas na economia de mercado.

Tal processo encontrou arrimo nos próprios objetivos que orientavam a irrigação pública implantada pelo Governo Federal no Nordeste, que, Conforme Bursztyn (1985) e Diniz (1997), eram basicamente o de introduzir um novo modelo de produção agrícola nessa região, via modernização da agricultura e incentivo a culturas agrícolas de maior produtividade com destaque para a fruticultura irrigada, e minimizar os conflitos agrários, desviando o debate da reforma agrária para os projetos de colonização, por meio da seleção de irrigantes para ocupar os lotes dos perímetros públicos.

O programa de irrigação destinava-se à criação de infraestrutura econômica e à aplicação de capitais públicos por meio da expropriação de terras, criando espaços propícios ao avanço do modo de produção capitalista, através do uso de técnicas modernas de produção, tendo como base as experiências do DNOCS como administrador de bens públicos.

A atuação do DNOCS consistia em desapropriar as terras das bacias de irrigação, onde seriam implantados os perímetros irrigados, dividindo-as em lotes agrícolas e, onde seriam alocados os colonos, ou irrigantes. Conforme nos lembrou Freitas (2010, p. 29), a implantação desse modelo ensejou forte antipatia ao órgão, tanto por parte dos pequenos proprietários expropriados, em razão dos preços deprimidos das desapropriações e indenizações, quanto por antigos moradores excluídos do processo de assentamento, que se viram expulsos e desassistidos de apoio para recomposição de suas moradias.

Pesquisas realizadas por Bursztyn (1985), Diniz (1997) Freitas (2010), Vasconcelos (2010) e Gadelha (2013) nos mostram que a forma como o DNOCS atuou e segue atuando no processo de desapropriação das famílias atingidas é caracterizado pelo autoritarismo, pela falta de informação e pelo pagamento irrisório das indenizações.

Nesse sentido, conforme analisou Diniz (1997), a política de irrigação acabou viabilizando uma verdadeira contra reforma agrária, na medida em que, na prática, tem-se observado que o número de famílias expulsas das áreas desapropriadas para a implantação dos perímetros irrigados é superior às famílias selecionadas como irrigantes.

A intervenção do Estado, via criação de perímetros irrigados, produziu um espaço adequado às necessidades do modo de produção capitalista, ao viabilizar a transformação da renda da terra em capital, utilizando-se das relações de trabalho familiar, caracterizando “uma subordinação direta ao capital, uma vez que os irrigantes são convertidos em pequenos capitalistas e sua condição de sobrevivência como produtores constitui a reprodução do próprio capital, materializado na forma de máquinas, adubos, sementes selecionadas etc. (…) Assim, o irrigante deixa de ser explorado pelo dono da terra e passa a ser subordinado tanto ao capital financeiro, ao contrair empréstimos no banco, quanto ao capital industrial” (DINIZ, 1997, p. 33)

Dessa forma, os irrigantes, ao serem selecionados, deveriam atender a uma série de critérios, desde a comprovação de sua capacidade administrativa até a adequação de seu comportamento moral. Uma vez satisfeitas todas as exigências, os irrigantes foram instalados nos lotes, deparando-se com várias imposições colocadas pelo DNOCS. Este, através de sua equipe, passou a controlar todos os aspectos da produção, tais como o tipo de produto, sua quantidade, extensão da área a ser cultivada, tecnologia a ser adotada, modo de circulação etc, bem como a também estabelecer seu autoritarismo em todos os espaços do perímetro.

Sendo assim, o perímetro irrigado constitui-se num território marcado pelo poder do Estado, que articula sua dominação através do controle das vidas dos pequenos irrigantes, visando à disciplinarização do individuo e ao controle dos recursos presentes, num verdadeiro processo de captura da mentalidade e do modo de vida camponês.

Nesse processo, podemos constatar ter sido operada uma mudança com relação à forma de conexão entre os interesses privados e as novas políticas de planejamento, na medida em que, “se, anteriormente, o paternalismo do Estado se materializava através da simples socialização dos custos dos investimentos em infraestrutura dos coronéis, atualmente o poder central procura também patrocinar a modernização capitalista na região, mediante estímulos à produção para o mercado e a criação de uma mentalidade empresarial entre os pequenos produtores” (BURSZTYN, 1985, P. 80).

Como forma de controlar e organizar a produção no interior dos perímetros irrigados, foram criadas as cooperativas dos irrigantes, tendo como objetivo viabilizar o retorno dos investimentos feitos nos mesmos, através do crédito agrícola, assistência técnica e comercialização. Desse modo, o Estado capitalista, além de manter seu controle sobre os irrigantes, pôde utilizar a produção como instrumento econômico e político e, assim, viabilizar os mecanismos de reprodução ampliada do capital.

As cooperativas, criadas no interior dos perímetros irrigados, apresentaram-se como o mecanismo por meio do qual o Estado disciplinou os colonos no uso de créditos financeiros junto aos bancos e de insumos modernos, impostos pelo pacote tecnológico de maquinários, fertilizantes e agrotóxicos. Ao mesmo tempo, serviam, em sua fragilidade, ao Estado, na medida em que se configuravam como uma organização fácil de penetrar e de manipular, seja pela própria tendência das direções das cooperativas a se desvincularem das bases, seja através dos mecanismos materiais e legais pelos quais as cooperativas se subordinavam em dependência ao Estado (SORJ, 1980, p. 76). Assim, conforme preconizado por Diniz (1997), no espaço físico dos perímetros irrigados, os irrigantes ficaram sujeitos a duas esferas de poder, quais fosse, o DNOCS e as cooperativas, que agiam como se estivessem a serviço dos irrigantes.

Portanto, além de preservar a estrutura existente, o Estado capitalista fomentou a formação de grupos de produtores que, sob as asas do paternalismo e sob o controle do autoritarismo oficial desempenharam o papel de “farmers”, inexistentes até então na estrutura social e econômica do Nordeste. Os irrigantes, adaptados aos mecanismos impostos pelo DNOCS, tornaram-se uma categoria social diferenciada da estrutura tradicional. Sua denominação, quer ela se dê em termos de “colonos” ou “irrigantes”, tornou-se um imperativo não só para análise de cunho teórico, mas também para o cotidiano das relações sociais ao nível local, com peso equivalente às outras expressões já consagradas, referentes às noções de identidade e representação, a exemplo da de “latifundiário”, “camponês”, “sertanejo”, “agricultor familiar” etc (BURSZTYN, 1985, p. 82).

Segundo Diniz (1997), outro fator de forte impacto foi a introdução de novas técnicas, relativas à adequação requerida pela agricultura irrigada. Ao fortalecer a implantação de um novo padrão agrícola na região, o Estado capitalista pôde, direta ou indiretamente, provocar uma mudança nas relações de produção vigentes no campo, impondo ao antigo camponês – meeiro, arrendatário, morador de condição – uma série de imposições para que fosse alçado à nova posição de “irrigante”. Ao ser obrigado a trabalhar com um novo padrão tecnológico, o irrigante passa por um processo desterritorializante (DINIZ, 1997), ocasionado pela perda da territorialidade anterior e pelo sentimento de estranhamento e não-pertencimento ao novo lugar e modus de moradia. Ele não se desfaz, porém, imediatamente das suas relações anteriores, haja visto que essa é uma dinâmica lenta e dolorosa de desenraizamento, que ocorre muitas vezes à custa de uma pressão muito forte por parte do DNOCS e de várias estratégias simbolicamente e/ou expressamente violentas.

São traçadas, assim, as condições para uma dupla desterritorialização dos camponeses, a primeira “pelo fato de parte dos desapropriados não receberem lotes e serem expulsos de suas áreas” e a segunda, por sobrarem aos camponeses – incluídos nas condições de irrigantes subalternizados às condições de produção das grandes empresas do agronegócio – a captura de seus saberes e práticas via “imposição do modelo de produção do agronegócio aos agricultores familiares” (PONTES et al, 2012).

Por intermédio do DNOCS, diversas estratégias são utilizadas para conquistar no plano ideológico a aceitação, legitimidade e necessidade da obra, neutralizando-se a crítica e a resistência daqueles que questionam os verdadeiros interesses da política de irrigação, com destaque para as comunidades atingidas e seus grupos de apoio (GADELHA, 2013).

 

3. Perímetros irrigados e a expansão do agronegócio: uma reflexão sobre a apropriação privada da irrigação pública

 

À época das formulações iniciais de Celso Furtado sobre as ações a serem desenvolvidas pela SUDENE, a proposta que mais despertou divergência junto às elites agrárias nordestinas, dizia respeito aos termos em que o projeto de lei de irrigação advogava como se dariam as desapropriações das terras localizadas nas áreas onde seriam estabelecidos os cultivos controlados das bacias de irrigação. O artigo 28 do referido projeto, que seria imediatamente derrubado no Congresso Nacional, dizia que “as propriedades que, na data desta lei, tiverem terras irrigadas com águas de sistema público de irrigação, serão total ou parcialmente desapropriadas, nos seguintes casos: a) Se pertencerem a proprietários que não exerçam a agricultura como atividade permanente; b) Quando maiores que dois lotes agrícolas do sistema; c) Quando a área irrigável da propriedade for menor do que aquela considerada econômica no sistema” (BARROS, 2013, p. 27) (grifo nosso).

A proposta de desapropriar as terras que excedessem dois lotes agrícolas ia totalmente na contramão dos interesses dos latifundiários da cana-de-açúcar. Sua derrubada de antemão atestava o que, posteriormente, se configuraria como umas das principais forças a agir sobre as políticas dos perímetros públicos no Nordeste, qual seja a de seu atrelamento a interesses concentracionistas e sua privatização.

De acordo com um estudo recente do Banco Mundial (VALDES ET al, 2004, p. 07), sobre os impactos e as externalidades sociais da irrigação no semiárido nordestino, estima-se que, por volta de 2000, existiam no Brasil aproximadamente 3,5 milhões de hectares irrigados, dos quais pouco mais de 500 mil localizados no semiárido. Desses 500 mil, em torno de 140 mil hectares estariam localizados em áreas públicas de assentamento e cerca de 360 mil em propriedades privadas.

Caso houvesse um gráfico capaz de representar o avanço desse processo no decorrer do tempo, ele indubitavelmente indicaria uma curva ascendente, em que a cada década que se passa, torna-se mais explícita a sujeição ao aproveitamento privado dos recursos públicos e bens comuns que a política dos perímetros irrigados promove.

Pois, se durante um primeiro momento, entre os períodos de 1968 a 1979, a política de irrigação tinha como prioridade a distribuição de lotes para a categoria dos pequenos produtores, estabelecendo a partir daí relações assistencialistas e de controle de integração da produção familiar às dinâmicas capitalistas, após 1990 atesta-se uma dinâmica de intensificação capitalista, em que a gestão dos perímetros passa a assumir um foco nitidamente localizado no desenvolvimento do agronegócio, havendo uma reorientação da ação estatal, com vistas à estimulação da privatização do território e do domínio da estrutura fundiária por parte das empresas.

Os objetivos que orientam a atual “nova política de irrigação” circunscrevem-se a apresentar estratégias que estimulem o investimento privado em todas as fases da irrigação, que orientem a produção para as oportunidades de mercado e redirecione a participação do governo na atividade, gerando sinergia entre a iniciativa privada e as esferas governamentais (MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO, 2008, apud FREITAS, 2010, p. 58).

É nesse arcabouço que os perímetros irrigados foram reconfigurados de forma a satisfazer a grande tendência de “produção de frutas a fim de atender ao mercado mundial e as necessidades das agroindústrias produtoras de sucos e doces” (SAMPAIO et al, 2008, p. 12). A irrigação moderna empresarial, então, nos moldes das exigências neoliberais, caracteriza-se pelo amplo incentivo às empresas privadas, estabelecendo um projeto de agronegócio no âmbito do semiárido, em detrimento da vida dos camponeses e de trabalhadores da cidade e do entorno dos perímetros irrigados (FREITAS, 2010).

A atração de empresas de grande porte, nacionais e multinacionais, à região envolve significativas alterações nas técnicas de produção, novos tipos, intensidades, riscos e acidentes de trabalho, bem como reconfigura as relações de parcerias com os pequenos produtores, que passam a utilizar, de maneira subalterna, o mesmo pacote tecnológico que os grandes empregam em suas plantações. A modernização agrícola, dessa forma articulada, deve ser compreendida em seu caráter conservador, pois se refere a uma forma particular de desenvolvimento da agricultura brasileira, que se limita a incrementar o uso de insumos químicos e instrumentos mecânicos, conservando sem alteração a “estrutura anacrônica da propriedade” e das relações sociais (GUIMARÃES, 1979 apud FREITAS, 2010, p. 22).

Esse processo vem acompanhado da expropriação da terra de trabalho e moradia dos povos do campo, fazendo com estes deixem de ser produtores para ingressarem no exército industrial de reserva como mão de obra barata à disposição, “contribuindo para alimentar o mercado de trabalho nas cidades e/ou nas empresas do agronegócio atraídas para os perímetros irrigados” (GADELHA, 2013). Os camponeses, indígenas, pescadores e ribeirinhos desapropriados dificilmente conseguem retornar ao perímetro irrigado na condição de irrigante e, mesmo a parcela reduzida que assim o logra, o fazem a custos incalculáveis, diante dos imperativos de toda ordem que precisam enfrentar para integrarem-se de forma subordinada ao modelo.

O processo de dominação dos territórios inseridos nas áreas de abrangência dos perímetros irrigados pode ser atestado pelas seguintes contabilizações realizadas em investigações que levantaram informações sobre os perímetros irrigados de Tabuleiro de Russas (CE) e de Baixo Assu (RN): “No projeto Tabuleiros de Russas (CE), são 622 irrigantes: 499 são pequenos produtores e 78 são empresas. Os pequenos irrigantes representam 88,22% do universo total e ocupam 37,78% da área total de 10.564 ha. Já as empresas, que representam 12,54% do total, concentram 47,65% da área. No projeto Baixo Assu (RN), são 197 irrigantes: 156 pequenos produtores (25,73%) e 25 empresas (7,88%). Os pequenos irrigantes concentram 25,73% da área total contra 70,15% da área destinada às empresas” (PONTES et al, 2012, p. 04).

Ressalte-se, ainda, que, apesar da grande concentração de terras nas mãos do setor empresarial e dos altos investimentos públicos que compõem toda a ordem de subsídios e incentivos fiscais à produção, transporte e comercialização das commodities do agronegócio, pesquisas como a de Freitas (2010), alicerçada em investigações do MPF e dados do próprio DNOCS, atestam uma ilegalidade bastante emblemática para apimentar a reflexão acerca da dinâmica de privatização dos perímetros irrigados, qual seja, a invasão de terras públicas.

Segundo a autora, no curso da desapropriação do perímetro Jaguaribe-Apodi, a exemplo do que acontece nos demais projetos, “cerca de 4 mil hectares, foi comprovadamente invadido, sobretudo por médios proprietários e empresas nacionais e multinacionais” (FREITAS, 2010, p. 87). Além de ampliar, ilegalmente, sua área de produção, as empresas fazem da invasão um mercado de terras lucrativo, “arrendando-a para terceiros, mesmo não tendo a concessão de uso das terras” (FREITAS, 2010, p. 112). Até 2001, período em que se intensificou a expansão das multinacionais na Chapada, um hectare de terra era vendido pelo valor de trezentos reais, após esse período, elevou-se para cinco mil reais (FREITAS, 2010 p. 69).

Mesmo diante desse quadro em que convergem para os perímetros a concentração de terras e vultoso investimento público, vários levantamentos indicam que, contraditoriamente, a maior parte das áreas irrigadas nos perímetros encontra-se improdutiva. No Jaguaribe-Apodi, “do total de 9.194,00 ha. de terras, 4.600,00 ha. são improdutivas” (FREITAS, 2010, p. 69).

No caso do perímetro de Tabuleiros de Russas, apenas 40% da primeira etapa está em funcionamento (FREITAS, 2010, p. 62), o que não impediu a continuidade das obras de sua segunda etapa, mesmo quando isso implicava na destruição de comunidades consideradas modelos de desenvolvimento na região do Baixo Jaguaribe, a exemplo da comunidade agroecológica de Lagoas dos Cavalos, no Município de Russas, Ceará.[4]

A crise fiscal do Estado e a orientação neoliberal têm provocado ainda uma transformação na concepção de gestão da política de irrigação. Medidas foram tomadas tendo em vista a emancipação dos perímetros irrigados já existentes[5], com o objetivo de transferir aos produtores a responsabilidade pela operação, manutenção e gerenciamento dos projetos públicos de irrigação, e também criando um novo modelo de irrigação, que passa a permitir a entrada de empresários do agronegócio no investimento e gestão dos perímetros irrigados.

Recentemente, segundo consta no 7º balanço anual das obras do PAC, foi “assinado o contrato de concessão de direito real de uso do perímetro de irrigação pontal/PE, que inaugura a modalidade de Parceria-Público-Privada (PPP) em irrigação no Brasil”[6]. No perímetro de Platôs de Guadalupe, no Piauí, “a iniciativa privada vai investir um bilhão de reais”, adquirindo a concessão de direito à exploração de 17.248 hectares durante 35 anos[7].

Foi dessa forma que os perímetros irrigados acompanharam as mudanças na política como um todo, expressão da irrigação moderna empresarial, tornando-se atualmente locus da reprodução do capital de empresas agrícolas nacionais e multinacionais.

No que diz respeito à atual expansão dessa política, quer estas se expressem em termos do avolumamento territorial das áreas irrigadas ou da ampliação de investimentos, novos conflitos estão se estabelecendo, ao passo em que antigos estão se acirrando. As atuais políticas de irrigação às quais se atrelam os perímetros irrigados seguem, portanto, divorciadas do contexto da urgência que deveria lhe orientar, de atender às necessidades dos grupos mais vulneráveis.

Ao não ensejarem nenhuma ruptura com as dinâmicas de produção de injustiças, os perímetros irrigados em sua expansão seguem como mais uma proposta que visa o aumento da disponibilidade de água no Nordeste segundo as perspectivas convencionais, tratando sem maior consideração para com o problema do acesso à terra, “como se a água no meio rural do território do semiárido fosse uma variável independente da estrutura de poder engendrada pelo latifundiário” (BARROS, 2013, p. 29).

Atual se faz a análise elaborada por Anthony Hall, ainda em meados de 1978, de que, apesar do apelo óbvio e do impacto visual imediato da “formação de áreas irrigadas e permanentemente verdes na região semiárida de distribuição de chuva irregular”, os “planejadores têm, contudo, ignorado o objetivo central de qualquer estratégia anti-seca efetiva, que é o de atender às necessidades do grupo dos produtores mais vulneráveis”, ao mesmo tempo em que “os altos custos sociais das técnicas de irrigação em vigor têm sido pouco considerados por motivos de conveniência”, concluindo que “o desenvolvimento da irrigação no Nordeste do Brasil mostra um exemplo claro de uma política tecnocrata que está amplamente divorciada do contexto dos problemas que tenta solucionar” (apud BARROS, 2013, p. 31).

Apesar das promessas de inclusão dos desapropriados, os perímetros irrigados não são idealizados para possibilitar uma incorporação digna das famílias atingidas, pois não comportam outra dinâmica de produção da vida que não seja aquela embutida na racionalidade econômica do agronegócio. Com o discurso de promover o desenvolvimento através da geração de emprego e renda e aumento da produtividade, os perímetros impõem uma nova lógica, moderna, produtiva, racional, empresarial, isto é, adjetivada de forma a implicar a compreensão “do território enquanto recurso e da terra enquanto negócio” (GADELHA, 2013, p. 16), marginalizando outros entendimentos que não se reduzam a essa aritmética.

Ao pretender absorver novos territórios “atrasados” à dinâmica de expansão de fronteiras e valorização do capital, os perímetros irrigados têm servido como moldes em que se reproduzem no semiárido “o modus operandi do agronegócio”. Antecipam, assim, as condições necessárias para o DESenvolvimento chegar, conforme elucidado por Gadelha (2013), ao passo em que DES-envolvem, expropriam o envolvimento das populações do seu território, expulsam, desterram os camponeses, agricultores familiares, indígenas e demais povos do campo que são vistos pelo Estado como atrasados e rudimentares.

 

4. Disputas territoriais entre o agronegócio e o campesinato

 

A partir da criação e expansão dos perímetros irrigados, nessa fase da “nova política de irrigação”, tem-se instaurado um crescente e intenso conflito territorial, que se traduz também numa disputa entre concepções, propostas e projetos de sociedade e perspectivas de futuro. Uma luta entre o Território dos Povos do campo e o Território do Capital.

O  atual modelo de desenvolvimento, por resultar de planejamento e execução descontextualizados da realidade local (ecológica e social) e desvalorizar os saberes, as práticas e a cultura local, criou e/ou agravou problemas sociais, econômicos e ambientais, tais como a concentração de terras, os deslocamentos compulsórios da população, a violência, o comprometimento da segurança e da soberania alimentar, as mudanças nas práticas sociais, a ruptura dos laços de vida comunitária, a imposição de outros hábitos culturais, as mudanças na dinâmica de cidades vizinhas, com a formação de “favelas” rurais, o uso intensivo de novas tecnologias de mecanização e a introdução de insumos (fertilizantes e agrotóxicos), relações e condições de trabalho precarizadas (baixa remuneração, descumprimento da legislação trabalhista, intensificação do trabalho, exposição a situações de risco à saúde), a redução da biodiversidade e dos serviços ambientais, a degradação do solo pela monocultura, o risco de desertificação, o elevado consumo de água, a contaminação do ar e das águas superficiais e subterrâneas por fertilizantes e agrotóxicos, a exposição das comunidades do entorno das fazendas à contaminação pelos agrotóxicos utilizados de forma intensiva.

Um destaque relevante diz respeito às agressões que se percebem sobre as reservas hídricas, emblemáticas na medida em que parece paradoxal que uma política de irrigação pautada sob o viés do combate à seca e da ampliação da disponibilidade de água no semiárido ponha em ameaça o próprio potencial hídrico da região. Pelo ritmo e características próprios ao processo produtivo do agronegócio, à sobrecarga e contaminação dos aquíferos por agrotóxicos somam-se outros impactos, a exemplo da erosão, assoreamento dos corpos de água e salinização do solo, ocasionados, principalmente, em função do desmatamento e do manejo incorreto do solo e das técnicas de irrigação ou drenagem.

Neste sentido, o agronegócio, considerado como “símbolo da modernidade” no campo, pelo uso de alta tecnologia e intensa produtividade, esconde, por trás desta aparência moderna, a barbárie da exclusão social e a expropriação dos povos do campo provocada pela concentração de terra e de renda. Por outro lado, a agricultura camponesa possui uma relação de equilíbrio com a natureza, fruto de sua prática de produzir diversidade, através do cultivo de diversas culturas orgânicas, ao invés das monoculturas do agronegócio, e de sua perspectiva em privilegiar a produção de alimentos à produção de commodities. A transformação da natureza se dá, portanto, sob o imperativo da produção e reprodução da vida, e não das diretrizes de mercado e da reprodução de capital.

O agronegócio e o campesinato formam territórios opostos, o que Martins (1991) denominou de terra de negócio versus terra de trabalho. Esses territórios entram em conflito, pois a produção do agronegócio baseia-se no princípio da exploração do trabalho, no latifúndio mecanizado, na monocultura, na produção em grande escala e no uso indiscriminado de agrotóxicos. Enquanto que, na produção camponesa, as principais características são a biodiversidade, a predominância do trabalho familiar e de várias sociabilidades no processo da produção, além da produção em pequena escala.

A esse respeito, Martins (1991) enfatiza que, no regime familiar, é o trabalho que legitima o direito de propriedade, ao passo em que, no regime de propriedade capitalista, é a exploração do trabalho de outrem a razão de sua existência.

Assim sendo, asseguramos que a concepção de terra para os povos do campo é diferente da concepção capitalista. Isso ocorre porque, para os povos do campo, a terra tem sentido de reprodução do espaço e da vida familiar, de liberdade e autonomia.

Para Diniz (2009), o camponês relaciona-se com a terra numa concepção mística, tendo-a como uma dádiva divina, implicada na idéia de que é a terra que fornece sua alimentação, sendo responsável pela subsistência da família. Dessa forma, podemos afirmar que há um modo especificamente camponês de ocupar a terra. A terra, para ele, é um meio de produção, um instrumento para a realização do trabalho familiar e para a produção dos frutos desse trabalho. Como avalia Woortmann (1993, p. 12), a terra, para o camponês, é “expressão de uma moralidade; não se vê a terra em sua exterioridade como fator de produção, mas como algo pensado e representado no contexto de valorações éticas. Vê-se a terra, não como natureza sobre a qual se projeta o trabalho de um grupo doméstico, mas como patrimônio da família, sobre a qual se faz o trabalho que constrói a família enquanto valor. Como patrimônio, ou como dádiva de Deus, a terra não é simples coisa ou mercadoria”.

Está clara a disputa por modelos de agricultura que, por sua vez, refletem em propostas e projetos distintos de sociedade. Um deles, enraizado em diversas comunidades camponesas, indígenas, quilombolas, ribeirinhas e de pescadores, preserva a vida e a biodiversidade, distribui renda, democratiza a terra e a água, ou seja, tem como objetivo principal a reprodução da vida. Essas comunidades vêm demonstrando que, apesar do pouco investimento por parte dos governos, é possível viver bem no campo, produzindo alimentos saudáveis, convivendo com a seca e transformando a realidade através da luta por direitos e do exercício da criatividade coletiva, que, entre outras manifestações, se faz repercutir nas várias tecnologias sociais de acesso à água que observamos no semiárido.

Por outro lado, há o modelo do agronegócio, que provoca a concentração de terra, de água e de renda, que destrói a natureza, polui as águas e o solo, ameaça a vida. Esse modelo tem como principal objetivo o lucro das grandes empresas, em detrimento da vida dos camponeses, dos indígenas, dos quilombolas, dos ribeirinhos e pescadores.

Conforme ressaltou a Comissão da Pastoral da Terra (2012), nessa disputa, os povos do campo contam com a força de sua resistência e o apoio dos seus aliados, enquanto que os interesses do agronegócio são defendidos, estimulados e financiados pelos poderes públicos e enaltecidos pela mídia hegemônica.

Como ilustração das inúmeras resistências que se construíram ao longo desses anos em que os perímetros irrigados despontaram e, por ora, se multiplicam no Nordeste, destacamos a fala de um camponês acampado no que se tornou a maior ocupação do Brasil, no acampamento Edivan Pinto, em terras potiguares, no enfrentamento ao projeto do perímetro de Santa Cruz, em Apodi/RN, onde se destacam as lutas do sindicato de trabalhadores rurais e dos camponeses na configuração e defesa de um território em que a força da agricultura familiar é irrefutável:

“Em relação ao nosso acampamento, em relação à nossa
moradia, estamos aqui […] aos três meses de ocupação, aos três meses de lona preta, aos três meses de luta, por acreditarmos na agricultura familiar […] Vamos desmitificar essa história que o governo federal está aqui pra beneficiar. Na verdade, ele quer nos retirar o direito, que tirar nossa terra para colocar nas mãos de grandes empresas […] Estamos aqui! O acampamento está sempre de portas abertas para quem quiser somar na luta.”

No perímetro irrigado Jaguaribe-Apodi, ressalta-se a notoriedade alcançada pelas lutas das comunidades por produção orgânica e agroecológica, por terra, água e contra os agrotóxicos, reforçadas na formulação de uma articulação entre movimentos sociais, organizações da sociedade civil, pastorais sociais, representações de trabalhadores, lideranças comunitárias e universidades, nomeada de Movimento 21, em referência ao assassinato de Zé Maria, liderança da comunidade de Tomé, assassinado em 21 de abril de 2010 por sua atuação junto à associação de agricultores sem-terra desapropriados e em defesa dos direitos da população contra a contaminação por agrotóxicos na região.

Ali próximo, no perímetro irrigado de Tabuleiro de Russas, evidenciam-se os embates das comunidades junto ao DNOCS pelo direito ao reassentamento e à garantia das áreas de produção orgânicas e agroecológicas, bem como a persistência de assentamentos da reforma agrária que se recusam a serem sufocados pelo agronegócio que se avizinha.

Enquanto isso, no perímetro irrigado do Baixo Acaraú, a resistência segue na luta pela demarcação da terra indígena e garantia de seu território.

É nesse espaço de conflitos e contradições que o campesinato se reproduz, não só na luta pela terra, mas, principalmente, na luta para continuar vivendo nela e na reafirmação de sua existência e dos modos de vida que a significam. A ameaça em perder a sua forma de reprodução social na terra de trabalho, em virtude das perspectivas de apropriação e expropriação promovidas pelos perímetros, repercute diretamente nas experiências de enfrentamento aos projetos do capital, resultando, portanto, numa potência de resistência que é, também, característica da reprodução do campesinato.

 

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[1] Comentário  do Ministro da Integração em exercício à época, proferida por ocasião da inauguração do novo sistema de irrigação do Perímetro Mandacaru, em Juazeiro (BA). Disponível em: http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2011/07/programa-nacional-de-irrigacao-para-o-semiarido-sera-lancado-em-setembro. Acesso em 15/03/14.

[2] O combate à seca tomava a forma de proteção hídrica, que consistia basicamente em ampliar as reservas de água, demarcando assim o que ficou conhecido como a “fase hidráulica”.

 

[3] Entre elas destacamos: PIN (Plano de Integração Nacional, 1970), GEIDA (Plano de Irrigação Pública para as Regiões Brasileiras, 1967); FINOR (Fundo de Investimento para o Nordeste, 1974); POLONORDESTE (Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do Nordeste, 1974); PROTERRA (Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo a Agroindústria do Norte e Nordeste do Brasil, 1975); EMATER (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural, 1976); PROJETO SERTANEJO (Programa Especial de Apoio ao Desenvolvimento da Região Semiárida do Nordeste, 1976); EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, 1981); PROINE (Programa de Irrigação no Nordeste, 1986); PRONI (Programa Nacional de Irrigação, 1986).

 

[4] Para saber mais sobre concentração, invasão e improdutividade nos perímetros irrigados, consultar tópico referente à violação do direito à terra e ao território.

[5]A “emancipação” dos perímetros irrigados foi uma medida do governo FHC, iniciada nos anos de 1980, seguindo-se as recomendações do Banco Mundial, condicionantes à renegociação da dívida externa e à concessão de novos empréstimos para países desenvolvidos e em desenvolvimento. A emancipação apresenta-se como um dos elementos do “novo modelo de irrigação”, por sua vez “centrado em três premissas de inspiração neoliberal: (i) a transferência da gestão dos perímetros irrigados; (ii) a redefinição do papel do Estado; e (iii) a prioridade do investimento público na irrigação privada e a orientação da produção para o agronegócio de frutas e hortaliças para exportação” (SOUSA, 2005, p. 226-227).

 

[6] Disponível em: http://www.pac.gov.br/pub/up/pac/7/09-PAC7_agua_e_luz_e_finais.pdf. Acessado em: 12/03/14.

[7] Disponível em: http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2014/03/perimetro-irrigado-no-piaui-tera-investimentos-de-r-1-bilhao. Acessado em: 01/04/14.

[1] Tais objetivos serão mais bem contextualizados a partir do desvelamento, no decorrer do texto, dos interesses e discursos que acompanharam historicamente as políticas de irrigação formuladas para a região, bem como dos efeitos percebidos nos territórios.

[2] Disponível em: http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/regional/governo-federal-vai-lancar-o-pac-da-irrigacao-1.758224. Acesso em: 05/03/14.

[3] Disponível em: http://www.pac.gov.br/pub/up/relatorio/d5ffe3c587aca5ff31cf2d373ba9456c.pdf. Acessado em 13/03/14.

[1] Caso relatado na comunidade de Lagoa dos Cavalos, onde a construção do canal referente à segunda etapa do projeto do perímetro irrigado de Tabuleiro de Russas resultou na desapropriação de moradias, áreas de produção, cisternas de placa e vegetação nativa. Ver mais informações em: Estudo de caso –Tabuleiro de Russas.

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